20 de abril de 2024
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Aleluia, irmãos

O caos político, o desmoronamento da cidade do Rio de Janeiro, a pobreza insolúvel de milhões de cidadãos, os hospitais onde as pessoas morrem abandonadas no chão, o sumiço de todos os valores éticos, a tragédia moral e cívica que se abateu sobre o Brasil me fez desenvolver uma doutrina teológica.
Sim, senhoras e senhores, acabei de fundar a Nova Igreja do Terceiro Mundo. Além de saber que, brevemente, estarei trilhardária, encontrei o método para que, no Juízo Final, todos sejam julgados com equilíbrio, sem dois pesos e duas medidas.

Assim, anuncio que, em minha recém-nata religião, o purgatório, local onde segundo o dogma católico as almas passam uma temporada para se purificar, é agora destinado apenas aos desencarnados do Primeiro Mundo. Os brasileiros – e também outras nacionalidades, que não citarei para não provocar um incidente diplomático -, tão logo falecerem, acordarão diretamente no paraíso. Com direito a todas as mordomias e benesses.
Purgar os pecados, os moradores do Terceiro, Quarto e Quinto Mundo já purgam enquanto estão vivos. Não faz o menor sentido utilizar a mesma régua para medir, por exemplo, os erros de um sueco e de um brasileiro. Ou de um canadense e de um africano. Gente que tem as necessidades básicas muito bem resolvidas (além de supérfluos maravilhosos), que túneis não desabam sobre a cabeça, que um simples bicho-de-pé não transforma adultos saudáveis em aleijados, que montanhas não deslizam anualmente provocando mortes e que viadutos não despencam por terem sido colados com cuspe, não pode e não deve ser julgado pelo mesmos parâmetros usados com a turma da periferia.
Portanto, brasileiros e pobres do planeta, uni-vos Cultivem a esperança, pois se você não foi pedófilo, assassino, estuprador ou ladrão de dinheiro público, vai morrer e encontrar a paz eterna. Nunca mais fila no SUS, nunca mais desemprego, nunca mais nenhuma das muitas injustiças que perturbam a existência carnal.
Quem quiser agilizar a entrada no paraíso, deve contactar a Nova Igreja do Terceiro Mundo e pedir um boleto. Desembolsando apenas vinte Reais por mês, você terá a seu dispor, após o desenlace, transporte direto e sem escalas até o céu.
Depois, relaxado numa nuvem fofa e confortável, assistirá, de camarote, a turma que nunca sofreu aprender na pele o que é não ter dinheiro. De brinde, testemunhará a escumalha do Congresso brasileiro expiar, nas chamas da purificação, cada tostãozinho roubado.
Aleluia, irmãos.

O Boletim

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