19 de abril de 2024
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Moro, o alto pardal


Game over. A disputa eleitoral acabou, e, adoremos ou detestemos, Jair Bolsonaro foi eleito presidente da República com mais de 57 milhões de votos. Aconteça o que acontecer, já entramos numa nova fase histórica que sucede a Nova República, o período da história do Brasil que começou com o fim do regime militar e fechou seu ciclo com a emergência do fenômeno do bolsonarismo e de sua vitória nas urnas em outubro.
Sociólogos, historiadores e cientistas políticos ainda não têm um nome para essa era em que acabamos de ingressar e, por enquanto, ninguém sabe direito mensurar a distância ou a convergência entre o discurso e as atitudes e gestos do novo governo. Tem-se um presidente eleito que, ao modo Trump, detesta o jornalismo, e um juiz, Sérgio Moro, encarnando com pompa e circunstância o papel de alto pardal da república bolsonarista, uma metáfora da personagem icônica da série Game of Thrones, o líder moral que desmoraliza o velho poder instituído e obriga a rainha a purgar em público suas vergonhas. E nada mais ilustrativo da indicação de Moro do que a frase do próprio presidente eleito ao comunicar que o juiz aceitara o convite: ‘parecia um jovem universitário recebendo o diploma”.
Quermesse
Nessa fase política e histórica que começamos a trilhar, uma das instituições mais atingidas tem sido a imprensa. O presidente eleito e o ex-posto Ipiranga, agora um dos super ministros e voz econômica do governo, já deixaram muito claro o que pensam de jornais e jornalistas que não lhes agradam. Mas falando de imprensa e trazendo o assunto para o quintal de casa, Salvador vem apresentando um case extraordinário nos últimos dias. No instante em que estarmos diante de uma esquina histórica e que ninguém tem a menor ideia de onde concretamente as coisas vão dar, quando todo mundo do meio sabe que determinados assuntos se tornaram proibidos nas redações, o que fazem alguns profissionais da área na cidade? Resolvem participar engajadíssimos de um bailinho de máscaras de quermesse.
Pulam às dezenas nos grupos de conversação on-line e nos perfis sociais de jornalistas baianos um faz de conta com um potencial incrível para convencer qualquer um de que algum gás hilariante continua sendo aspirado intensamente no Brasil. A imprensa de Salvador diz nos fóruns mais restritos que acha medonhos determinados comportamentos recentes e atuais do baronato nacional da mídia. Mas olhar a mediocridade do umbigo ninguém quer. O que dizer de uma instância social que está literalmente sendo empurrada para o precipício, uma instituição cujo papel é o de nortear a opinião pública e que está enfrentando uma crise de credibilidade jamais vista se, no meio dessa tempestade toda, jornalistas começam a pedir votos para um prêmio criado ontem e por uma empresa de assessoria de imprensa? Ou há algo muito errado na engrenagem jornalística, ou ser cafona não incomoda mais ninguém ou profissionais da área não estão entendendo nada do que está acontecendo ao seu redor.
Difícil saber o que é mais grotesco. Se a invenção de um prêmio por uma empresa de assessoria para supostamente valorizar nesse instante o jornalismo enfermo e agonizante ou o fato de dezenas de jornalistas que querem continuar sendo levados a sério estarem nos espaços públicos implorando votos para serem laureados num prêmio de paróquia. Se é para salvar esse tipo de imprensa, acreditem: vai faltar salva-vidas. Não foi só a esquerda ou centro-esquerda brasileira que não entendeu a música que estava tocando lá fora. Boa parte dos jornalistas locais também continua pendurada no lustre de Alice, que está por um fio.

O Boletim

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