23 de abril de 2024
Sergio Vaz

Para não esquecer quem enfiou o país no buraco

Uma reportagem e um editorial preciosos ajudam muito.
Ao longo dos seus 13 anos e 5 meses, o governo “popular” do lulo-petismo entregou nas mãos de grandes empresários “subsídios do Tesouro em volume dez vezes maior do que o destinado aos programas sociais”.
Está no editorial de O Globo deste domingo, 20/8, “Esquerda perde o rumo e tenta reescrever a História” – um editorial precioso, que fala na “perene negativa à História” perseguida pelo PT e seus satélites PSOL, PCdoB, PDT.
“Na tentativa diária de reescrevê-la, renegam o direito à verdade, conceito que invocaram no campo jurídico para construir uma narrativa do passado sob a ditadura. Abjuraram o exercício da política com o maniqueísmo.”
Bate na tecla fundamental, que tem que ser batida sempre, sempre: a de que, em sua luta diária para reescrever a História, o PT e seus satélites tentam atribuir ao atual governo a responsabilidade pelo que os governos Lula e Dilma fizeram:
“Desequilibraram as contas públicas e reacenderam o estopim da inflação punitiva dos mais pobres. (…) No Congresso, PT, PSOL, PCdoB, o PDT e parte da Rede uniram-se na interdição do debate, debitando a culpa pela quebra do país na conta do PMDB, antigo sócio no poder e que governa há apenas 14 meses.”
Transcrevo a íntegra do texto mais abaixo.
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A absurda, disparatada, insensata generosidade do governo “popular” para com o grande capital a que o editorial de O Globo faz referência é bastante esmiuçada em bela reportagem publicada neste mesmo domingo pelo Estadão.
Os repórteres Alexa Salomão e Marcelo Godoy apresentaram uma série de perguntas ao BNDES, com base na Lei de Acesso à Informação; obrigados por lei a responder, os técnicos do BNDES abriram um pouquinho a caixa preta das tenebrosas transações do período Lula-Dilma, e assim, o país pôde ficar sabendo que de 2005 em diante, os governos lulo-petistas liberaram, via BNDES, R$ 14,5 bilhões para grandes grupos empresariais brasileiros investirem fora do país.
Gorda, rechonchuda Bolsa Empresário, a juros baixíssimos – subsidiados pelo Tesouro, ou seja, por todos nós, pagadores de impostos, inclusive, claro, todos os que ganham o salário mínimo ou pouco mais do que ele.
Juros pela TJLP – uma excrescência que a equipe econômica do governo vem tentando substituir por uma nova taxa a longo prazo, mas que está enfrentando dura resistência das entidades do grande empresariado.
Desse total de R$ 14,5 bilhões, R$ 11,7 bilhões, ou 80% do total, foram para as empresas do setor de carne.
A JBS ficou com mais da metade dos recursos. Somando financiamento, aportes via debêntures e ações, a JBS recebeu 56% de tudo que o sistema BNDES investiu ao longo de uma década em favor de todas as empresas que se lançaram na internacionalização de suas operações.

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O presidente Michel Temer receber Joesley Batista à noite no Jaburu é crime? Tá, é crime. Mas dá para comparar com o crime cometido pelos governos Lula-Dilma de entregar para esse bandido mais da metade de absurdos $ 14,5 bilhões do Bolsa Empresário?
A reportagem do Estadão sobre os números da Bolsa Empresário vai mais abaixo.
Esquerda perde o rumo e tenta reescrever a História
Editorial, O Globo, 20/8/2017.
Sem rumo, partidos como o PT, o PSOL, o PCdoB, o PDT e outras organizações autodenominadas de esquerda, como a Central Única de Trabalhadores, têm dado exemplos diários de perda de capacidade de formular propostas realistas, construtivas, para o país. Esvaiu-se a vivacidade com que somavam ideias ao debate nacional, mesmo quando inspirados em modelos fracassados no século passado, como se viu na extinta União Soviética. É lamentável, porque a vitalidade da democracia depende da participação construtiva de todos.
Antes fecundo, o PT se mostra desértico em proposições para o país. Subsiste em estado de negação da própria crise, de fundamentos éticos. Limita-se à tentativa de reescrever o passado, com evidentes falsificações da História.
O PSOL, o PCdoB, o PDT e parcela da Rede aderiram à autodesconstrução. Está visível na Câmara e no Senado a virtual conversão desses partidos em satélites petistas, alinhados nos dogmas e na destruição da identidade.
Esses agrupamentos denominam-se de esquerda. É compreensível no atual e gelatinoso universo parlamentar, mesmo quando desfilam com ideias apropriadas do liberalismo, como é o caso das políticas de renda mínima.
Grave, porém, é a perene negativa à História. Na tentativa diária de reescrevê-la, renegam o direito à verdade, conceito que invocaram no campo jurídico para construir uma narrativa do passado sob a ditadura.
Abjuraram o exercício da política com o maniqueísmo. Cooptaram os movimentos sociais. Omitem os erros nas políticas de saúde e educação — o sistema educacional está devastado, sobretudo nas universidades, por uma pedagogia que alinhou a didática e a formação à negação do debate, admitindo-se apenas as ideias originadas na autodenominada esquerda.
Desequilibraram as contas públicas e reacenderam o estopim da inflação punitiva dos mais pobres. Nos governos de Lula e Dilma premiaram empresas financiadoras de campanhas — as “campeãs nacionais” —, com subsídios do Tesouro em volume dez vezes maior que o destinado aos programas sociais. Essas relações incestuosas emularam a corrupção sistêmica. No Congresso, PT, PSOL, PCdoB, o PDT e parte da Rede uniram-se na interdição do debate, debitando a culpa pela quebra do país na conta do PMDB, antigo sócio no poder e que governa há apenas 14 meses.
Dissimulam, também, na sedução totalitária. Exaltam Getulio Vargas e abstraem a ditadura do Estado Novo. Apoiaram o autoritarismo de Hugo Chávez na Venezuela até com negócios extremamente prejudiciais ao Brasil, como no projeto da refinaria de Pernambuco. E, agora, solidarizam-se com a ditadura de Nicolás Maduro abduzindo a centena de mortos neste ano e os incontáveis presos políticos. Sem aprender com os erros, tentam mudar a História.
Frigoríficos levaram 80% das verbas externas do BNDES
Por Alexa Salomão e Marcelo Godoy, Estadão, 20/8/2017.
Os dados são do próprio Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (BNDES), principal instituição de fomento das empresas brasileiras. Se há um setor que tenha recebido especial atenção do banco durante o governo do PT no que se refere a ganhar o mercado internacional, esse setor é o de carnes.
Segundo levantamento feito pela área técnica do banco, a pedido do Estado, por meio da Lei Acesso à Informação, dos quase R$ 14,5 bilhões liberados para internacionalização de empresas brasileiras, de 2005 para cá, R$ 11,7 bilhões – 80% do total – foram para os frigoríficos.
O levantamento considerou operações via Finem, uma modalidade de financiamento, e do BNDESPar, braço do banco que compra participações nas empresas. Há uma importante diferença entre as modalidades. Financiamentos precisam ser pagos, pesam nos balanços, restringem o fôlego financeiro. Compras de participações equivalem a ganhar um “sócio capitalista”, que coloca dinheiro no negócio e fica esperando a empresa crescer para poder vender sua fatia com lucro – ou prejuízo, se o investimento der errado.
Detalhe: no total, o banco contribuiu com a internacionalização de 16 empresas de setores como bebidas, petroquímica, mineração, mas apenas uma delas, a JBS, ficou com mais da metade dos recursos. Somando financiamento, aportes via debêntures e ações, a JBS recebeu 56% de tudo que o sistema BNDES investiu ao longo de uma década em favor de todas as empresas que se lançaram na internacionalização de suas operações.
O que chama a atenção é a concentração de recursos no caso do BNDESPar. A partir de 2007, ele praticamente se dedicou à internacionalização do setor de carnes. Dos R$ 12,7 bilhões que investiu na globalização de empresas nacionais, R$ 11,5 bilhões – 90% do total – ficaram com três empresas da área. O destaque foi a JBS. A empresa recebeu R$ 5,5 bilhões. Se for levado em consideração que o banco injetara R$ 2,5 bilhões na internacionalização do frigorífico Bertin, comprado pela JBS, a empresa da família Batista acabou ficando com 63% dos aportes do BNDESPar voltados à globalização das empresas brasileiras no período. A cifra soma R$ 8 bilhões.
A forma como foram feitos os investimentos nos frigoríficos, em particular na JBS, sempre foi fonte de polêmicas. Soava como favorecimento. Consolidou-se a percepção de que o governo petista adotara a política de injetar recursos para a criação de conglomerados globais brasileiros, apelidados de “campeões nacionais”.
A delação do próprio empresário Joesley Batista adicionou um novo componente à discussão. Joesley contou ter pago caro pelo dinheiro do BNDES – e não se referia aos juros, que estavam entre os mais convidativos do mercado na época. A pedido de Guido Mantega, ex-presidente do banco e ex-ministro da Fazenda, contou ter desviado 4% dos recursos liberados pelo BNDES para o PT. Mas Joesley isenta o banco e seus funcionários. Garante que o “por fora” foi acertado só com Mantega. O motivo alegado por Joesley: evitar que os seus projetos fossem barrados. Segundo o empresário, em nenhum momento se burlou o processo seletivo, que teria cumprido todos os trâmites exigidos pela instituição.
O Tribunal de Contas da União, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal discordam. Tentam estabelecer uma relação mais ampla entre as quantias destinadas à JBS e o pagamento de propinas. As autoridades contabilizam que o BNDES liberou R$ 20 bilhões ao grupo dos Batistas. Investigam em particular os R$ 8 bilhões que o BNDESPar injetou na JBS e os R$ 180 milhões que a empresa obteve por meio do Finem.
Há uma força-tarefa que investiga os empréstimos do banco. A Operação Bullish, que cumpriu quase 60 mandatos de busca e conduziu 40 funcionários da instituição para depor, aponta seis irregularidades nas transações entre BNDESPar e JBS. Duas das principais operações teriam causado prejuízo de R$ 1,2 bilhão ao banco.
O MPF alega que os gestores públicos teriam concordado em pagar mais pelos papéis da empresa dos Batistas, além de abrir mão de multas, numa transação que envolveu R$ 3,5 bilhões em debêntures, convertidas em ações em 2011. Também questiona o fato de o BNDES ter aceito que o dinheiro entregue à JBS tivesse um destino diferente do acordado, sem que novos estudos financeiros fossem feitos. Foi o caso do aporte de R$ 624 milhões que seria dirigido à aquisição da National Beef, nos Estados Unidos. Os órgãos reguladores americanos não autorizaram o negócio e o BNDESPar poderia reverter o investimento. Sucessivas revisões no contrato de concessão dos recursos fizeram com que a JBS pudesse “guardar” o dinheiro.
O banco nega irregularidades. Segundo o Estado apurou, técnicos do BNDES alegam que o TCU tem apresentado “interpretações equivocadas” das operações, porque seus técnicos não têm conhecimento de como funcionam operações no mercado de ações e de debêntures, os instrumentos utilizados pelo BNDESPar.
Tanto a JBS quanto o BNDES negam a concentração de recursos no setor de frigoríficos utilizando uma conta diferente: somando os investimentos do banco no setor de carnes nos mercados interno e externo. Em nota, o banco informou que “apoiou o desenvolvimento das mais diversas empresas em diferentes setores” e que os investimentos nos frigoríficos fizeram parte de uma política de governo mais ampla: “O apoio recente do BNDES ao fortalecimento e internacionalização de grupos empresariais brasileiros”.
Segundo o banco, a orientação governamental “estabeleceu setores com capacidade de projeção internacional a serem apoiados por vários instrumentos de fomento. Coube (ao banco) o papel de financiador dos setores prioritários”. O BNDES lembrou ainda que, apesar de seguir a política do governo, suas decisões “são respaldadas por critérios técnicos e pelas melhores práticas bancárias”.
O BNDES reforçou que o apoio ao setor de carnes não se restringiu à JBS ou a grandes empresas. “Entre 2005 e 2016, foram contratadas no BNDES R$ 18 bilhões em operações de crédito para mais de 1.700 empresas e cooperativas de abate e fabricação de produtos de carne. O volume representou pouco mais de 1% do valor de todas as operações de crédito aprovadas pelo BNDES.”
Na conta do banco entram as operações no Brasil e no exterior. Ele informou que, entre 2005 e 2016, desembolsou em todas as suas operações cerca de R$ 83 bilhões por meio da aquisição da debêntures, ações ou por meio da participação em fundos de investimento, os chamados instrumentos de renda variável. “Desse montante, R$ 12,4 bilhões foram para empresas de abate e fabricação de produtos de carne, cerca de 15% do total. Atualmente, o setor representa menos de 10% da carteira da subsidiária de participações do BNDESPar”, diz a nota. Sobre a delação da JBS, o banco informou que “todos os fatos provenientes de investigações oficiais são objeto de avaliação integral por Comissão de Apuração Interna (CAI)”.
A JBS informou que o BNDESPar detém hoje 21,3% de suas ações, com direito a dois assentos no conselho de administração, e negou que essa participação seja fruto de favorecimentos. “De acordo com o Livro Verde, recém-lançado pelo BNDES, entre 2001 e 2016, na lista de maiores clientes do banco, a J&F aparece em 19.º lugar.” E concluiu afirmando que “tais investimentos auxiliaram na profissionalização e na melhoria da imagem do setor”.

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